terça-feira, 13 de novembro de 2007

Cena 12 - Super-homens e mulheres

Pronto. Saí do meu coma bloguístico. E antes que vocês perguntem, sim, dava para ouvir tudo. Todas as conversas paralelas ao meu redor, essas que vêm em formato de postagens e comentários nos blogs amigos e no meu. Passou-me pela cabeça entrar nas discussões quase teológicas que andaram ocupando os seus muros. Mas estou de TPM, e creio que todos concordariam que não se pode esperar palavras de sabedoria de uma mulher nesse calamitoso estado. Uma vez por mês todos os nossos problemas emocionais, espirituais e temperamentais ganham justificativa biológica e uma lente de aumento e aí nós ganhamos licença da sanidade. Mas voltando ao assunto...

Super-homens e mulheres

Meus dias de ócio puro e profundo me levaram a assistir muito mais televisão do que eu gostaria. Acabei assistindo a um episódio de um seriado que evitava por preconceito: Smallville. A vida do Super-homem quando adolescente, interpretado por um ator que, se tivesse morrido aos 18 e renascido, já estaria à porta da adolescência outra vez. O que mais me chamou a atenção no personagem, não foi a visão raio X, a estrutura de aço, nem mesmo os olhos verdes ou o sorriso de propaganda de creme dental, mas o fato de ele ser alguém que carrega um segredo que resume grande parte de quem ele é. Na cena, a garota que faz as vezes de centro do universo Clark Kent (e que não se chama Lois Lane) vem até ele e lhe dá uma oportunidade de revelar o que esconde. Mas o segredo tem vida própria. Por mais que ele tenha vontade de deixá-la participar de quem ele é, algo o convence de que ela não poderia, ou não compreenderia.

Confesso que me identifiquei com o menino herói. Sinto que ando por aí carregando uma identidade secreta, uma série de possibilidades e capacidades que ninguém enxerga. Histórias que o mundo não conhece, aprendizados, lições, sentimentos, disposições, perdões, amores, saudades, idéias. Poderes. Pedaços de mim que me capacitam a amar, compreender, cuidar e quem sabe até ajudar e ensinar. Mesmo os traumas, complexos e arrependimentos, que podem não ser bonitos, mas que me fazem apreciar atitudes simples como alguém que fica, que ouve, ou que de outra forma retribui uma amizade.

Imagino que sejamos todos um pouco assim. Temos superpoderes que mesmo aqueles que convivem conosco diariamente ignoram. Podem não ser sobrenaturais, mas são essenciais. Somos mais do que aparentamos. Temos desejos e sonhos que ignoram o bom-senso, choramos em segredo, rimos de nós mesmos, e isso tudo muitas vezes é vivido sem testemunhas (humanas). Queremos ser mais, significar mais, fazer mais diferença. Mas nos contemos, talvez por orgulho, medo, ou simplesmente porque aprendemos assim.

Como o Clark, algumas de nossas experiências dizem que o mundo não entenderia. Poderíamos nos doar mais uns aos outros, se não aprendêssemos com o mundo que quem o faz se machuca. Ampararíamos com mais freqüência, se as pessoas admitissem que precisam de ajuda. Retomaríamos de braços abertos uma amizade perdida, se ao menos o outro demonstrasse que se importa. Demonstraríamos mais carinho, se isso não fosse quase sempre submetido a rótulos. Temos muito mais a dizer, muito mais a oferecer ao mundo. Sentimentos que não servem de nada a não ser quando compartilhados. Histórias que perdem o sentido se não forem contadas.

O alienígena Clark Kent é muito mais humano do que parece. Uma metáfora de nós mesmos. Não temos laser saindo dos olhos, mas também podemos enxergar além da superfície. Não somos de aço, mas já suportamos muito mais do que aparentamos conseguir. Não podemos ouvir a quilômetros de distância, mas ouvimos por horas a fio. E seria bom se aprendêssemos a nos deixar conhecer, ao menos por aqueles que nos amam. Até onde eu saiba, o relacionamento mais significativo do nosso herói foi aquele em que, em algum ponto, ele rendeu-se ao risco e deixou-se ser visto e apreciado por completo. Não é fácil, e nem sempre vai parecer que valeu a pena, mas no fim, é sempre um alívio saber que alguém mais no mundo entende por que você reage mal a críticas, não sabe lidar com mudanças, fica carente todo dia 14, odeia pimentão, tem uma cicatriz no joelho esquerdo ou sai correndo de uniforme azul e capa vermelha quando alguém pede socorro.