sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Cena 8

Venho por meio desta interromper a infame greve de produção de textos da minha vizinha Márcia. Se bem que eu considero a atitude dela(s) menos uma greve do que uma chantagem pressionadora. Mas acabou dando certo, e eis o motivo: uma coisa seria privar os meus leitores imaginários da minha dose semanal de coisa alguma. Outra coisa é privar o mundo de todos os blogs amigos! Então, antes que eles se sindicalizem, apresento aqui minha bandeira branca e meus parágrafos cinzas.

Antes de mais nada, devo explicar que o silêncio não se deve a nenhuma súbita emigração de todas as palavras do meu dicionário interno para o buraco negro mais próximo. Nem sequer é um problema de falta de idéias. É mais como uma anestesia da inspiração. Vazio de sentimentos causado pelo excesso deles. Eu explico (e se vocês se esforçarem, podem até entender. Nesse caso, por favor me liguem e elucidem).

Verdade que o tema de fortes e castelos já foi usado, abusado, reciclado, remanejado para a seção de pessoal, virado do avesso, lavado, passado, tingido e reformado, mas na falta de um poeta por perto, fico com essa analogia mesmo. Eu, que fui aos poucos me distanciando do meu forte, hoje me encontro parada diante dele, estática, como quem encara uma possibilidade quase aterrorizante. A cada dois dias dou dois passos a frente, só para recuar outra vez. Os passos de recuo encontram um impulso vestido de certeza de que aquele é o único lugar seguro.

O motivo da hesitação é que eu conheci o mundo aqui fora. E esse mundo marcou imagens na minha mente que insistem em gritar que valem a pena. Talvez valham, mas não sei se suporto a pena (que de leve só têm o nome). Nada é realmente leve quando se trata de coração, de relacionamentos Verticais ou horizontais. Frustrações e decepções podem ser mascaradas, num esforço heróico para manter qualquer sanidade cristã, mas algum momento de honestidade profunda os revela. Não quero ter dúvidas, aprendi na EBD que são o primeiro passo para a incredulidade. Mas se os meus sentimentos mais sinceros não me fazem bem, só conheço o caminho de volta para o vazio.

Como se manda o coração mudar suas reações? Como se faz algo importante para você deixar de importar? Como se faz uma dor parar de doer? Neste último caso conheço o poder dos analgésicos. Enfrento enxaquecas desde os 4 anos de idade. Os 6 médicos já visitados são unanimes em dizer que não há cura, há tratamento. Minhas doses semanais de tylenol não me livram do problema, mas anestesiam o meu organismo de forma que ele pouco me atinja. Essa é a versão médica do forte. Vive-se bem, mas dependente do não sentir.

E cá estou eu, encarando a única solução aparentemente viável para o meu problema. Se não posso mandar no meu coração, posso ao menos adormecê-lo, antes que ele se volte contra quem não deve. Mais ou menos como colocar um animal selvagem para dormir, de forma que ele não ataque quem quer lhe trazer cuidados. Infelizmente não tenho anestesia local no meu estoque, então a medida me fez entrar no vazio. Estou à porta do forte, não entrei completamente nem fechei a porta (ou não escreveria este texto) porque o vazio que o preenche já não me atrai. Mas ele ainda parece o único lugar seguro.

Então, caros amigos blogueiros e leitores reais, suspendam a greve, levem seus cartazes e voltem ao trabalho. O mundo precisa de vocês!!!! Eu preciso de vocês. Meus vazios costumam ser repletos de filmes e textos, qualquer história que não seja a minha, quaisquer sentimentos que não sejam os meus. E perdoem a minha falta de assunto. Não gosto de escrever quando não posso dar a quem lê algum sabor de humor ou bem-estar. Nunca pretendi que este blog fosse um diário nem sessão terapêutica, a qual me faria paciente de toda a comunidade cibernética. Mas a verdade é que devo a vocês boa parte do meu equilíbrio (mesmo ele não sendo a parte mais evidente de mim). Sintam-se livres para comentar, minha vida é um blog aberto.

PS: Acho que desta vez eu tenho de torcer para que apenas meus leitores imaginários apareçam por aqui. Tem um pouco mais de sinceridade neste texto do que eu gostaria, mas me disseram que era terapia em grupo!!!

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

Cena 7 - Minha nada coerente vida

A vida da nossa tão abrangente classe média já é, sem auxílio externo, uma grande contradição. Metade das pessoas que eu conheço vivem quebradas, mas comem fora em todas as oportunidades. Quem precisa de casa própria se você pode comprar uma televisão de 210 polegadas e tela tão plana que deve ser mantida na horizontal porque senão a imagem desliza? Dez vezes quase sem juros. São as incoerências e peculiares administrações financeiras da vida.

Minha participação nessa sociedade é bastante agravada pelo meu ambiente de trabalho. Aqui, quando meu expediente é estendido devido a algum evento, eu como camarão e vitela: na cozinha. Outro dia estava traduzindo um artigo baseado no discurso de um ministro britânico em visita ao Brasil. Durante o processo comecei a mergulhar no glamour do momento, a confiança que haviam depositado em mim, o artigo sendo publicado no dia seguinte, em nome de uma autoridade do mundo desenvolvido. Mas meus pensamentos foram interrompidos quando tive de sair da mesa correndo para dar lugar ao estagiário, que ocupa minha mesa na parte da tarde. De meu aqui, só o trabalho.

O auge dessa sensação me veio em uma quente tarde de julho. Estava há meses participando ativamente da organização da visita da Princesa Real britânica ao nosso querido Mulato Inzoneiro. O dia correu como planejado, todos os eventos em perfeita cadência, culminando em uma pequena reunião com os funcionários para finalmente termos a chance de falar com a filha da Rainha Elizabeth II (ou, o que me parece mais importante, tia do Príncipe William). Quando chegou a minha vez, o Embaixador me apresentou como "a temporária que está sempre aqui" e ela fez alguma brincadeira igualmente engraçada. Em algum nível do humor britânico esses comentários divertem surdos e puxa-sacos. Estendeu a mão e nos cumprimentamos. Foi interessante, não sei se algum dia terei a oportunidade de conhecer outra pessoa que use uma coroa e não esteja saindo do Burger King. Alguns minutos depois, caminhei 20 minutos sob o sol vespertino até a parada (de salto e terninho), subi no ônibus, e liguei para minha mãe para contar tudo isso. Imagino que as pessoas que estavam me vendo em pé em um ônibus lotado em movimento, tentando me equilibrar enquanto segurava minha bolsa com uma mão e o celular com a outra, devem ter pensado que a próxima coisa que eu iria contar é que havia dançado a valsa com o Bill Clinton.

Enfim. Vou-me. Acabei de conhecer mais um ministro britânico que aparentemente vai mudar alguma coisa importante no mundo ou pelo menos o cardápio do almoço. Mas eu tenho de ir, porque nos restaurantes que eu posso pagar, se não chegar cedo o feijão acaba.

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Adeus, Pavarotti

Gente! O Pavarotti morreu! Ou não, essas grandes lendas não morrem, elas "deixam a vida para entrar na história", como já disse alguém. Sem entrar em méritos espirituais, se morrer implica em deixar de existir, uma pessoa que deixou sua voz gravada em tantas mídias, ouvidos e corações engana a morte. Tenho a estranha tendência de sentir saudades dessas pessoas que nunca conheci e jamais conheceria, mas que por algum motivo admiro. Fico um pouco triste pelo mundo, que agora carrega um gênio a menos. Por essas e por outras, e ainda que sua marca permaneça, deixo aqui meu respeitoso adeus.